* Ecio Rodrigues
No
final da década de 1990, quando teve lugar a edição da Pnial (Política Nacional
Integrada para Amazônia Legal), os atores sociais e representantes do poder
público, na Amazônia, chegaram a um consenso: o caminho para a sustentabilidade
passava, necessariamente, pela exploração da elevada diversidade biológica
existente na região.
Essa exploração
deveria ser realizada, obviamente, por meio de uma tecnologia de manejo que
permitisse a manutenção do ecossistema. A boa notícia é que essa tecnologia
existe há mais de 20 anos e já se encontra consolidada. Atualmente, o manejo da
biodiversidade para a oferta de produtos consagrados, como madeira, copaíba e
queixadas, não encontra obstáculos de ordem tecnológica.
Todavia,
a exploração da biodiversidade deveria ir além desses produtos tradicionais, penetrando
no universo amplo da bioprospecção – que, por sua vez, conduz à descoberta de princípios
ativos a serem empregados nas indústrias farmacêutica, de cosméticos e de
pigmentos, somente para citar as mais promissoras.
Ou
seja, a exploração da biodiversidade que levaria a Amazônia ao caminho da
sustentabilidade deveria adotar a tecnologia de manejo florestal que já se
encontra consolidada na região e incluir um processo permanente de inovação
tecnológica voltado para os ativos a serem empregados em biotecnologia.
Com
objetivo de desenvolver a biotecnologia na Amazônia, o governo deu início à
construção do Centro de Biotecnologia da Amazônia, CBA. Contando com estrutura para
a realização de pesquisa de ponta, à época considerada a mais avançada da América
do Sul, e com equipe de pesquisadores qualificados, o CBA poderia promover o
surgimento de uma nova economia ancorada no potencial da biodiversidade.
Cunhou-se
de “Zona Franca Verde” esse novo modelo de ocupação produtiva, que teria na
diversidade biológica seu principal instrumento. Em tese, tratava-se de
organizar um aglomerado econômico, ou um cluster da biodiversidade, que, ao
promover as indústrias que empregam a tecnologia de manejo florestal, conjuntamente
com a poderosa e promissora indústria da biotecnologia, permitiria à Amazônia
desenvolver-se com base na sua principal vantagem comparativa frente a outras
regiões – a floresta.
Ao
invés de continuar investindo no fracassado modelo da Zona Franca de Manaus,
que não torna a Amazônia competitiva perante o Sudeste do país, e que se
mostrou inviável sob o ponto de vista econômico e ecológico, a despeito do
inegável apelo social suscitado pela geração de postos de trabalho (instáveis,
diga-se), a Amazônia iria adquirir competitividade por meio da Zona Franca
Verde, explorando uma biodiversidade que é monopólio regional, isto é, que
nenhuma outra região possui.
Todavia
– e infelizmente –, tudo não passou de conjecturas e propostas, esquecidas em
meio às mudanças de dirigentes e de governos. Nenhum político da região, de
nenhum partido político e de nenhuma origem, em nenhum momento, se levantou
para defender a finalização das obras do CBA e o seu pleno funcionamento.
Dificuldades
de gestão pública – para dizer o mínimo –, que já chegaram a causar a extinção
da Bioamazônia, organização social criada para cuidar dos contratos e da viabilidade
comercial do CBA, até hoje persistem, embora passados quase 20 anos do início
das obras.
Enquanto
as autoridades públicas, em âmbito municipal, estadual e federal, sem exceção,
temerosas de perder votos, se embaralham na defesa intransigente e equivocada
da industrialização forçada trazida por montadoras de quinquilharias, como
acontece na Zona Franca de Manaus, o cluster da biodiversidade se perde na
falta de visão e de prioridade, e não vai a lugar algum.
Uma
coisa é certa. Se não há capacidade estatal para implantar o cluster da biodiversidade,
pode esquecer. A sustentabilidade não vai acontecer por acaso.
* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac),
Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e
Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em
Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).